quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Usuário Impaciente

Sou professor de informática há mais de dez anos e trabalho com web cerca de quatro anos, isto me permite escrever o que você irá ler nas próximas linhas.
Quando trabalhava com pesquisa via web há cinco anos atrás, tinha a meu dispor uma coleção de mais ou menos seis buscadores e, por mais complicado que fosse o assunto, encontrava a minha resposta em até dois dias. Atualmente temos quase que um monopólio da gigante Google que a cada mês compra uma nova empresa e lança uma constelação de softwares e recursos novos para os produtos já difundidos no mercado. A empresa Google e todo o seu Grid se tornaram peças fundamentais para as mais diversas áreas de atuação comercial e no âmbito da educação, isto é uma verdade incontestável, e, mesmo que o mais “do contra” diga que isto não é bem assim, sabemos que se a rede Google “sair do ar” o globo capitalista entrará em colapso imediatamente.
Aqui não se trata de um ponto de vista consumista capitalista radical, mas sim, da realidade de todo o sistema privilegiado que se utiliza da internet como motor de funcionamento. Sabemos que jamais se poderá negar que o mundo não é totalmente globalizado, que a internet está presente em todos os lugares, porém, a força comercial, política, cultural e educacional que desenha o mundo moderno está felizmente ou infelizmente calçada nas bases digitais da internet e web.
Atualmente o Google Grid sufoca os outros serviços similares e todos os buscadores concorrentes, seja comprando ou disponibilizando recursos muito atraentes e de incrível versatilidade, além de, ser totalmente gratuito e exigir apenas que o computador ou aparelho possua acesso à rede mundial. Este monopólio está tornando o serviço de busca “inchado” e extremamente irritante, pois, você pode ficar pesquisando durante dias até encontrar uma pista do que deseja. O aumento de publicações sem controle e das “neuroses” ditas modernas, acabam por acelerar serviços novos que ainda não possuem controle sobre si próprios, um exemplo disto é o famoso Orkut e suas “infinitas” comunidades que servem apenas como rótulo gerador de status pessoal. O grande número de fóruns, blogs, portais e web sites pessoais cresceu absurdamente e seu conteúdo é cada vez mais questionável no que diz respeito à fonte original. Esta grande “feira” de informação mistura certo e errado em proporções alarmantes, fazendo com que uma simples busca por uma questão se transforme em uma “caçada” de semanas.
Uma busca no Google não pode mais se resumir ao primeiro link encontrado e nem à primeira página que traz como padrão uma lista de dez endereços. Em um teste feito com minhas turmas no curso de internet em abril de 2006, levamos cerca de uma hora e meia pesquisando quinze sites para encontrar a extensão oficial da muralha de China. A mesma pesquisa feita no ano passado (maio de 2007) para encontrarmos a mesma resposta, tivemos que pesquisar em cinqüenta e dois sites. O número de informações incoerentes e de sites que se contradiziam foi de aproximadamente 42%, levando este professor e seus alunos à beira da loucura. Neste caso a expressão “tem que ter saco” foi levada a sério. Os problemas ainda se agravam quando o usuário não tem a mínima noção do sistema de chave de busca pelo qual o buscador é programado para atender, aumentando em até 80% o número de resultados considerados fora do raio de interesse. Esta nova mentalidade pelo prático e rápido está tornando a sociedade jovem uma massa não pensante e totalmente artificial, como se os seus cérebros fossem buscadores web.
Ao observar clientes de Lan house, percebi graves problemas no momento da busca e isto torna o resultado “sujo” o que leva o usuário a ficar irritado e não completando o seu objetivo. Esta situação possibilitou uma nova área no mercado que se encarrega de fazer buscas em troca de uma certa quantia, uma espécie de achados e perdidos para informações. Este novo tipo de serviço se destina a pessoas que necessitam de informação 100% confiável, porém, não possuem tempo ou “saco” para encontrar o que procuram. Ouvimos freqüentemente a expressão procura no Google, faz Google que tu achas e uma lista de outras diversas frases como incentivo e “luz” no fim do túnel para os desesperados por encontrar a resposta para a pergunta que o tortura. Estes problemas na busca estão associados a uma falta de cultura e informação básica, sendo a grande maioria erros de ortografia e falta de informação mínima do que se busca. Buscas por nomes de doenças, plantas, carros importados, softwares, autores, são muitas vezes infelizes por terem suas chaves de busca digitadas de forma errada. Na maioria das tentativas o próprio Google facilita dando ao usuário um alerta e ainda por cima oferecendo uma opção do que provavelmente ele queria dizer, mas, caso isto não venha a acontecer, muitos desistem e dão por encerrada a busca tendo como conclusão a não existência de uma resposta.
Se uma informação desejada não estiver listada no resultado do Google, significa que nossa pergunta não tem resposta?
Respondo esta pergunta com outras perguntas:
- Será que digitei corretamente a minha chave de busca?
- Minha chave de busca está dentro do contexto da minha dúvida?
- Qual é o tipo da informação que desejo?
A moda de ser frenético por causa da velocidade do avanço da tecnologia impregnou a sociedade jovem de tal forma que tudo está sendo desenvolvido nestes moldes. As próprias leis de construção estrutural dos web sites dizem que um usuário deve conseguir localizar visualmente o que deseja em até quinze segundos e o seu alvo deve estar ao seu alcance em no máximo três cliques do mouse. Este condição torna os usuários seres bitolados, extremamente exigentes e ao mesmo tempo, seres modernos drasticamente limitados ao que podem ver na área do seu monitor. Esta teoria hoje muito bem já disseminada entre todos nós, prega a extinção do físico (jornal, revista, livro) em prol de uma biblioteca digital única universal, onde o que não é listado não é verdadeiro ou não existe.
Esta impaciência ao acessar buscadores e sites seria uma conseqüência do avanço rápido da tecnologia relacionada à internet?
Porque as fontes físicas estão se tornando apenas referência de trabalhos universitários?
Pensando neste problema a Wikipédia que inicialmente era uma fonte pequena de pesquisa e hoje é gigantesca, passou a adotar novas regras. Estas regras exigem que toda contribuição seja seguida de uma fonte/referência, caso contrário, o artigo é colocado em dúvida e pode ser votado e retirado da enciclopédia. Ao lado do Orkut e do MSN a Wikipédia se tornou um dos “lugares” mais freqüentados por aqueles que buscam respostas. Com a idéia de Wiki (Construa a partir de contribuições), vários projetos nasceram dentro das diversas áreas do conhecimento. Este é um dos motivos do enorme crescimento dos Fóruns e dos Blogs, onde a informações estão melhor organizadas, assim, facilitando a busca. Uma vez que um tipo de informação esteja concentrada em um só local/página a busca se torna menos penosa e mais prática. Os blogs também estão a um passo de sofrer uma mudança, pois o grande número de postagens, obriga a existência de inúmeras divisões, páginas e, portanto, um sistema melhor organizado e motores de busca internos mais poderosos.
A impaciência dos usuários atuais se forma pelo fato de existirem muitas respostas para muitas perguntas, porém, todas em um único lugar. As deficiências nos motores de busca, organizações deficientes de informações nos web sites, o grande número de falsas respostas na web, tudo associado a uma certa preguiça crônica gerada no seio da nova geração devido a forma como o sistema nos entrega estas informações, provocam o "caos" na exploração pelo 100% confiável. Tudo que não está ao alcance dos olhos do usuário (área do monitor) não é importante ou simplesmente não existe. A busca não automática se tornou sinônimo de antiquado e desnecessário. Os livros estão sendo substituídos por mp3 ou pdfs e cada vez mais as pessoas não conseguem pegar uma caneta ou lápis para escrever algo, cada vez mais as pessoas não interpretam as coisas como devem ser. As bancas de revistas e as bibliotecas estão cheias de pessoas menos atingidas pela revolução digital, as pessoas “abençoadas” pela tecnologia digital não possuem paciência ou tempo para se deslocarem até um destes locais, então fazem do Portal Terra ou da Globo.com sua janela de hiperinformação.
Se o Google não acha a culpa é de quem?
Se o Google não acha algo, não é importante ou não existe?
Se uma informação não está na Home ou piscando diante dos meus olhos eu não devo procurar um pouco mais?
Os sites com “toneladas” de informações devem concentrar tudo em uma única página para atrair os interessados?
Somos doentes por velocidade e praticidade ou estamos nos tornando preguiçosos ao ponto de esperar que todas as nossas dúvidas caiam direto em nossas mãos?
Diversas vezes auxiliei alunos em buscas e muitos deles ficaram com vergonha ao perceber que suas respostas estavam mais abaixo ou mais acima dentro de uma página de um web site ou blog. Em alguns casos a falta de atenção permitiu que um link não fosse detectado e ali estava tudo que precisavam.
Alunos com dificuldade em encontrar informações sobre um continente com um Atlas dentro da pasta, parece absurdo não é?
Aqui não estou dizendo que a partir de agora devemos abandonar a internet, afirmar isto provaria que sou um morador de outro planeta. O que gostaria de deixar claro neste momento é que o Google, buscadores e web sites em geral não são as únicas fontes do planeta.
O que procuro pode estar ao meu lado naquele livro atirado sobre a mesa, ali mesmo, do lado do monitor. Será que aquela revista na sala não tem algo, já que ele fala sobre ciência? Temos que saber aproveitar melhor a internet, porém, para isto temos que ter uma base mais sólida, algo que ainda está nas fontes físicas, ou vocês acham que todas as informações que circulam pela rede mundial nasceram dentro dela?
Acredito que parte da impaciência dos novos usuários está mais relacionada à preguiça de antes procurar em meios físicos para depois optar pela rede.
Certo!
Quem sabe vamos à rede primeiro, mas, se não ficar muito fácil, vamos tentar um livro, uma revista e assim melhorar meu conhecimento sobre o assunto. Entendendo melhor podemos extrair mais da Internet e contribuir caso realmente o que descobrimos ainda se encontra nela. Conversar pessoalmente e dizer o que pensamos não machuca, discutir com outras pessoas nossas concepções nos ajuda a refletir sobre o que sabemos realmente sobre algo. Por favor, somos seres humanos e apesar da artificialização do mundo, ainda somos seres sociais!